Cantigas

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Uma vitória da precisão


Música em Salvador.
Pleonasmo identitário de uma tropicalidade tão nossa quanto estrangeiramente imputada.

Música em Salvador no frio julho tem que ter quentura. Mesmo aquela que não pareça a princípio algo de temperatura elevada, daquela a que estamos acostumados nos nossos fevereiros de fevereiras paixões.

Terça-feira na cidade da Bahia. Casa de espetáculo na orla de Salvador. Jota Velloso e Cavaleiros de Jorge recepcionando ícones. De ontem, de hoje, e quem sabe de amanhã?

Neste encontro, a luz brotou entre olhares e estrondosos ruídos.
Queremos mesmo ouvir algo na noite fria de julho em Salvador?
Alguns queriam e ouviram/viram desvirginar-se à frente, na penumbra de fogs do palco e da inconteste e bela presença de Alex Mesquita, a voz/figura de Virgínia Rodrigues.

Advinda das cenas elevadíssimas das mais técnicas possibilidades vocais, a Virgínia chegou. Os ruídos (incovenientes acompanhantes de órfãos das fevereiras noites baianas) quase a fizeram vacilar.
Engano da suposta força dos ruídos, Virgínia venceu.
A precisão, a emoção, o gingado de corpo e alma desta baiana/universal cantora foram mais eficazes.
Graças a Deus! O álcool, o ti ti ti e a celebrização da simples presença num espaço considerado "in" não foram capazes de não nos fazer ouvir/ver a presença fulgurante e competente do brilho da voz.

Minha voz, minha vida, meu segredo e minha revelação.
Em Virgínia, o que há de revelações, reside justamente num mistério: como há de vingar a flor de lótus no meio de um lodo por vezes tão pobre de húmus?
Até Gregório de Mattos pôde ser evocado de forma contundente, para contemplar uma possível celebração da inteligência dos presentes, dos partícipes, dos proponentes da noite. Que cidade é mesmo a da vergonha?
Será que esta vergonha está na dança do ator sobre a dança (acima das desgraças) da Bahia ali ausente, cujo ruído nem de longe se ouvia?
Será que a dança do ator a desavergonhar a Bahia expressaria o que de fato era a desonra do poeta?

Como diria Vinícius (não poeta, mas poetinha), ao dizer da Pátria amada "de fato, não sei".


Noite bela, mas noite múltipla.

A isso tudo, precisamente (ela é virginiana?),
Virgínia venceu.

E que bom que estavam alguns por lá para perceber.
E que bom também que a cidade da Bahia, nos seus meandros, nas suas vielas, avenidas e ruazinhas, ainda pode deixar sair a luz de uma voz/corpo/alma artística tão fortemente sedutora. Sedução que cumpriu a função de dar rasteira na razão (e no irracional de estar num lugar para nada ver, além de si próprios) e fazer platéia ceder, baixar cabeças e render-se.

Êta sedução de baiana porreta.

Me deixe ser Jorge Amado, por que suas vergonhas me estão mais à mostra que as que à mostra, ontem, me deram.

No mais, não vi Daniela Mercury, que, após minha retirada, pousou para trazer uma Bahia em que vergonha, desonra e mentira também se submetem (como assim o fizeram com Virgínia) ao signo da alegria, vibração e força, de uma outra baiana porreta, bárbara e estelar.

Axé, Bahia!!!!!!!!!!!!!!

Um comentário:

Unknown disse...

Muito legal Carlos. Adorei!!!
Luzia Moraes

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