Cantigas

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Da flor no lodo - o que Danilo Gentili não sabe...




A homoafetividade é um tema que (2012, século XXI e "novas eras" à parte) ainda representa um corte. 

O assunto parece uma lâmina afiada na veia jugular dos brasileiros. Esta lâmina faz jorrar lentamente o sangue dos conceitos sobre a vida que se afirmam desde que o pau-brasil foi extraído pela primeira vez no interesse dos ibéricos cheios da fé católica anti-amor entre os iguais.

As telenovelas abordam, os telejornais listam conquistas, os teleguiados comentam - e todos vivemos hoje sob a bandeira da "tolerância" e da "diversidade" buscada como éden contemporâneo. 
Este é o quadro. 
E o fato é que esta lâmina brilhante e "colorida" que corta tudo continua sendo um problema na concepção de mundo e na ideia sobre a vida neste país em que os morros são "pacificados", os políticos cassados assumem cargos públicos e Salvador ainda não tem Metrô.

Recentemente, o jornalista Danilo Gentili mais uma vez fez piada sobre o tema, utilizando-se de uma estatística cruel acerca da morte de pessoas em função (de alguma forma) de sua condição sexual homoerótica.

O rapaz brincou, foi criticado, mas a bem da verdade, sua fala representa um extrato do pensamento corrente entre grande parte da população no Brasil. 

Todos dizem "aceitar" a presença dos gays, lésbicas, bi-sexuais e afins, mas a simples convivência com qualquer manifestação de afeto, carinho e/ou desejo entre pessoas de sexos iguais, sobretudo publicamente, ainda é "uma vergonha", deve ser restrita a "quatro paredes" e etc. 

Os transexuais e travestis, estes nem figuram no rol do respeito, a partir do olhar tosco e bruto direcionado para os personagens cujo gênero transcende a norma biológica.

A fala de Gentili é uma imanência semântica: traz para a zona do popular midiático aquilo que se escuta e fala nos corredores de escolas, nas mesas de bares, nas salas de jantar (em que as pessoas ainda estão preocupadas meramente em nascer e morrer) sobre os viados, bichas, baitolas, sapatas, roçonas e termos mais utilizados para depreciar a existência do afeto e amor entre seres humanos que nasceram com a genitália comum.

O jornalista "engraçado" fala do cu (com o perdão do termo) como ícone da questão. E é aí que reside o problema da sexualidade vista como algo fétido, obscuro e que deve ser escondida. O cu é o tema, não o amor.

Ser gay significa exatamente - nesta visão reducionista e parca - estar meramente submetido a esta parte do corpo, associada à sua contraparte fálica, que é o pênis. Este binômio está incorporado nas mentalidades e atua a partir do pensamento pobre daqueles que julgam o homoerotismo pelo olhar fisiológico e só.

Se somarmos a estas miradas sobre estes lugares corporais a genitália feminina (que se encontra com outra genitália feminina em relações deste gênero), está montado o sistema de representações do senso comum acerca da homoafetividade. 

Neste campo de significados, tudo se resumiria aos binômios em foco aqui. 
Tudo seria apenas encontro de genitais. 
Tudo seria mercado de moedas e fluidos corporais. 
Em fato, tudo é este conjunto de fluidos. E eles compõem, mas não são exclusivos de todo o restante humano.

O que Danilo Gentili não tem condições de entender - e nisso participa de uma população bem maior - é que carinho, afeto, amor e toda uma gama de sensações e sentimentos muito mais profundos podem emergir entre pessoas - sem definição de pólos sexuais. Que o diga, aliás, o ator José de Abreu, em recente declaração sobre "pan-sexualidade".

Brasil: o sexo não é corte; é ligação. Os corpos não são meros agentes de desejo.
Queiramos superar dualismos...
Mas aí, para isso,  será preciso fazer com que a brutalidade se converta em flor. 
E eu bem sei como isso é poético demais para Danilo Gentili e muitos outros seres que habitam este planeta Brasil.
Infelizmente, não tenho lá muitas esperanças... mas... quer saber? 
O mundo roda!

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