Cantigas

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Amor, meu grande amor!


Amar ao próximo como a si mesmo é um mandamento bíblico. Ter a capacidade de se doar, se dar, se colocar no lugar do outro e estar apto a sentir são atitudes inscritas na mais perfeita ordem cristã, desde as falas mais famosas do Homem de Nazaré.

Amar é o verbo que caracteriza o filme Do começo ao fim
Doar-se é tudo o que os personagens centrais fazem.
Amar, amar e amar...

Não há momento da narrativa em que não se perceba o sentimento amor em evidência, seja na direção acertada de Aloísio Abranches, nas expressões de grandeza artística de Júlia Lemmertz ou nas inúmeras (e muito bem realizadas) cenas de amor carnal entre os personagens Francisco e Tomás. 

Os atores João Gabriel Vasconcellos e Rafael Cardoso interpretam de maneira tão íntegra os rapazes que se amam desde a infância que nossa sensação do outro lado da tela situa-se entre o louvar de um profissionalismo raro ou o desejo de que seja real mesmo.

Do começo ao fim nos remete aquelas histórias de amor que já vivemos, queremos viver ou fugimos a vida inteira: amor incondicional, sem travas, sem neuroses e com inteireza. 
Os rapazes - irmãos, cuja aproximação íntima chama atenção da mãe e de um dos pais logo cedo - poderiam ter sua história interrompida, tratada num divã psicanalítico ou mesmo agressivamante debelada pelas mãos da família, da escola ou de qualquer outra instituição social dessas que servem para tolhir e castrar...

Mas não; a conversa aqui é outra: o amor vence (do começo ao fim) e mesmo sem o mundo virar de ponta cabeça, como sugere o personagem Tomás, eles vivem uma intensa possibilidade de entrega pouco comum no mercado da vida contemporânea.

O diretor poucas vezes polemiza com o incesto e é aí que reside o maior mérito da obra: por vezes esquecemos que eles são irmãos e mesmo quando o pai e padrato deles entra em cena (vivido por Fábio Assunção), não há sinal de recalque, repreensão ou medo; simplesmente, em se tratando do amor deles, sempre foi assim. 

Tomás e Francisco se amavam desde cedo!
Enquanto outros filmes como Shelter (De repente Califórnia) ou emsmo Brockeback Mountain podem funcionam como estandartes do movimento gay (e o fazem com maestria), Do começo ao fim é uma historia de amor entre dois homens que não serve muito para bandeiras. Se coloca num patamar tão sutil entre a decência, a moral e a verdade, que não funciona como mote de passeata, não pode ser usado como elemento de clamor civil. Está muito além.

A beleza inconteste dos dois rapazes, as cenas tórridas e às vezes até chocantes (para a sociedade brasileira que não tolera beijo e amassos entre rapazes...) são elementos fílmicos tradicionais que ajudam a conduzir a película e nos envolvem, nos fazendo torcer para que o amor acabe mesmo vencendo.

O que mais surpreende em Do começo ao fim é a capacidade de convencer em uma situação cuja verossimilhança pode ser questionada em alguns momentos: como a mãe (Júlia Lemmertz), na sua tradicional posição social de classe média alta carioca poderia reagir de maneira tão tranquila à percepção de que algo a mais acontecia no envolvimento dos filhos?
Como não propor uma viagem de estudos a um e uma namorada-noiva-esposa para o outro?

Sabe por que não nos importamos muito com isso ao ver o filme?
Por que o amor vence na narrativa.
Todos acabamos querendo que Tomás e Francisco fiquem juntos.
Todos queremos viver, de alguma forma, este amor que supera tudo em volta com a certeza de ser e pronto.
Todos queremos ter um Francisco ou um Tomás na nossa vida.
Todos!

Em certa altura do filme, o ainda criança Francisco diz ao irmão amado Tomás que cuidará dele para sempre.

Ficamos felizes em noventa minutos ao perceber que ele e seu amor não estavam mentindo.

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