Cantigas

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Brilho de Orfeu (por Lúcia Marsal)




Brilho de Orfeu


Quando você vai em busca de um tom que lhe ofereça sabor e saber, perde o caminho  é se vê “obrigada” a passar pelo mar para chegar a seu destino, guiada por uma filha de Yemanjá, percebe-se logo que as emoções da noite irão servir para lhe mobilizar por milênios. Parece exagero? Então, vejamos.

Olhares; vozes; sorrisos; abraços; muitos abraços; abraços muito apertados tentando congelar o momento; conhecimentos; reconhecimentos;  memórias; ancestralidade. Estamos diante de alguém que sabem quem é, sim.

A ética, a estética, o canto e o encanto de Barros, a firmeza dos Barros, num recanto do Rio Vermelho,  nos faz desejar colocar os pés no chão, pisar na terra, revolver a fina camada de pó da superfície avermelhada e chutando, delicadamente, - seixo a seixo - construir pontes que nos elevem, lentamente, até o céu-firmamento que se constrói nota a nota, acorde a acorde. Essa elevação toma todo o Rio Vermelho e se constitui como infinita e eterna.

As dores das árvores velhas, árvores velhas, são aplacadas por uma voz que lhe leva ao céu. Céu-firmamento. Nada dark tem condição de entrar neste momento mágico, neste espaço sagrado, no qual até as garrafas demonstram mais humanidade do que quem deseja macular suas paredes divinais.

Vivemos neste mundo hostil e por isso,  nem muito
emocionadas, podemos prescindir da lucidez que a razão nos cobra. Diz um do clã dos Barros quando cuida de seu
coração;"orai e vigiai”.  Então nosso olhar esquadrinha  todos os cantos e lugares e nossa ligação com o sagrado blinda todas e todos de pensamentos nefastos.  E a poeira cósmica vai.


Isso ocorreu em uma noite quase sem luar, apenas a fina nesga do inicio da lua crescente sorria para os mortais. Também, nem  este céu-firmamento poderia abrigar tanto brilho. Minto, poderia sim, este próprio céu sempre se permitiu  trocar figurinhas com   bandas e bandos; o da Lua,  o Anunciador e mais recentemente a Banda do Céu.

A Banda do Céu faz meu coração de bola, amor. Alex, Marcus, João e Pedro acompanham a voz de Carlos. É um casamento perfeito, desses que não deixam dúvida. Nele, liberdade não prende o querer, há um porto seguro onde se pode ancorar e a luz se expande, irrompe,  numa vasta visão.  
Mas as garotas que fazem parte da fina flor das vozes femininas da nova Bahia, Déia Ribeiro, Juliana Ribeiro e Márcia Short espalham sua força ainda mais suavemente com os acordes lançados pelos meninos. Ororo Oyá, Iansã – raios, trovões, relâmpagos - tempestades rasgam o  céu e  fazem todo mundo se arrepiar.

E se as garrafas se humanizam, é possível que viremos árvores e nos curvemos para pegar no vento os  sons de Carlos Barros e da Banda do Céu. Bem ao gosto de Orfeu.
Que este brilho lhes abra todos os caminhos e permita que o mundo enxergue estes meninos e que nada resista a tanto talento. Quando isso acontecer, vai durar milênios e vai ser tão bom, tão bom, tão bom... assim como abrir no peito um sol feroz.


Lúcia Marsal, out/2009

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